“Aos poucos a gente vai mudando o foco.
E o lugar nem te acrescenta mais, você começa a precisar de outros lugares.
E de outras pessoas. E de bebidas mais fortes.
Nem pensa. Vai indo junto com as coisas.”
– Caio Fernando Abreu, escritor.
A frase acima descrita não está aqui por acaso. Esse artigo vem com aviso para quem não gosta de ler: afaste-se. Cabe ressaltar que muito embora direcionado à, o corpo desse texto não se aplica somente à The Walking Dead, podendo ser empregado em qualquer aspecto de nossa vida cotidiana.
The Walking Dead veio – para a TV – com o anúncio de ser uma série com enredo de apocalipse zumbi e sobrevivência. Os fãs, majoritariamente os que não seguiam os quadrinhos, acabaram comprando a ideia de que o show de TV tratava única e exclusivamente sobre zumbis, mordidas, sangue e morte. De fato, um dos ideais do drama de TV é justamente esse.
Entretanto, como supracitado, a série se trata de um drama. Não, The Walking Dead nunca deveria ser citado como terror (embora o primeiro episódio da sétima temporada esteja aí para contrariar os argumentos). Conforme o dicionário da Língua Portuguesa, drama é uma expressão que designa aflição e sofrimento também podendo se tratar para a arte como a encenação onde o cômico e o calamitoso do cotidiano se misturam formando uma série de episódios trágicos, comoventes ou patéticos.
Ocorre que, uma parcela de fãs – e se torce para que seja uma insignificante parte – episódio após episódio vem a expressar descontentamento com a série embasada na obra de Robert Kirkman. Os argumentos são sempre mirados ao fato de que a série perdeu seu rumo, deixando para trás a intensidade, ação, mortes e os próprios mortos-vivos para se focar sobre embate de grupo de sobreviventes. Ainda reforçam que há uma dissonância e ausência do foco inicial da série.
Ora, iniciei citando Caio Fernando de Abreu não por acaso – como já anteriormente mencionado. A frase que introduz esse artigo nos mostra que cotidianamente, isso é, em nosso dia comum, nós mudamos o foco que seguimos. Os fatos, situações e fenômenos imprevisíveis do dia a dia montam e remontam nosso alvo de vida. Num dia temos, noutro podemos não ter. Nossa vida lida com incertezas o tempo todo. Acordamos com a pretensão de chegar no horário do expediente de trabalho, mas ao meio do caminho podemos nos enredar em um trânsito caótico, então nosso foco que antes era chegar no horário passa a ser “chegar com o mínimo de atraso”. Assim também, o ávido leitor iniciou essa leitura com o ideal de termina-la, mas nesse exato momento já pensa em parar por aqui, fechar a página e seguir sua rotina.
Então, caro walker, para falarmos que The Walking Dead – como série – perdeu seu foco, precisamos analisar duas vertentes: a que já descrevo até aqui e a vertente artística.
O que tentei expressar até essa altura é que, The Walking Dead é um drama e drama trata sobre o cotidiano com algumas adições (no caso tendo como pano de fundo o apocalipse zumbi). Ou seja, as pessoas continuam ali com seus problemas, com suas qualidades e defeitos. Ainda há pessoas invejosas, ciumentas, falsas. As pessoas ainda sentem amor e ódio, raiva e calma ao administrar situações. Ainda existem pessoas simpáticas e atrativas e outras chatas e desinteressantes. Há os simplistas e os aproveitadores, ou os sinceros e transparentes e os mentirosos e os atores da vida real que se escondem e se defendem por suas máscaras (lê-se Carol Peletier).
A série traz à tona o ser humano vivo com seus maiores instintos em evidência. Retrata as dificuldades de ser uma comunidade quando os interesses de sobrevivência são maiores do que os interesses de unidade. Trata sobre as relações inter-humanas. Assim, para isso ser retratado, episódios denominados como “aquele para encher linguiça” por alguns, são totalmente necessários.
Apresenta um caminho mais acelerado para onde a humanidade contemporânea caminha: a individualidade total. Nós, hoje antes de qualquer catástrofe apocalíptica, já olhamos apenas para nós mesmos e para nossos interesses. A sociedade fugiu do que era em seus primórdios, quando a comunidade agia pelo bem da comunidade (há ainda tribos indígenas que se configuram dessa maneira) e não do ser individual. Isso é, eu caço para que a caça seja de todos ou mais longe ainda, o filho não é do pai e da mãe e sim da comunidade, que é responsável por seu cuidado. Na série vemos esses dois mundos colidirem, onde a defesa da sua comuna é tudo o que importa, mas onde há um acelerado ritmo de individualismo entre os protagonistas (a forma de Rick agir pensando sempre primeiramente em si e em seus filhos, bem como Carol abandonando o grupo para ser individual e agir por si própria, por exemplo).
Na segunda diretriz, não há como não citar as histórias em quadrinho. Querendo ou não, lendo ou não, The Walking Dead é embasada nos materiais impressos de Kirkman. E assim, se Kirkman resolver no meio de sua história adicionar centauros alados zumbis, nada o impede e nada impede que isso se torne tão determinante para a história a ponto de ser necessária sua inserção na série de TV.
Não há problema algum em não ler as histórias em quadrinho, mas o problema está em ser totalmente intransigente e intolerante sobre o fato de que: The Walking Dead como série não pode fugir de sua matéria base. Pode haver pequenas alterações, adições, adaptações, mas não pode fugir do rumo que os quadrinhos tomaram. Aguardar que Negan seja morto no próximo episódio e que o grupo volte para as matas e a série se foque apenas na luta contra zumbis é totalmente inaceitável. Isso desrespeita e afunda totalmente a obra de Kirkman.
Basicamente – para quem é religioso, segue ou seguiu alguma religião ou ao menos compreende o que isso significa – os quadrinhos impressos são como o livro de normas religiosas (como a Bíblia Sagrada, por exemplo) e a série como o fiel religioso (o cristão no caso). Ou seja, obviamente, o fiel não conseguirá seguir absolutamente todas as regras que o livro dita, mas se esforçará ao máximo para segui-las, já que não fazer o mínimo esforço e ignorar a existência das diretrizes normativas é se desqualificar como fiel. O fiel não pode dizer crer em algo no qual ele não dá crédito algum. Então, a série seguirá sim os quadrinhos, dando alguns tropeços (isso é, haverá adaptações como personagens exclusivos e histórias novas, como os lobos mais recentemente), mas no fim não estará muito longe do material base.
Se tu chegaste à leitura até essa altura, preciso lhe confrontar com a ideia de que o foco das histórias em quadrinho é alterado a partir da edição número 100 (a morte de Glenn). A partir daí, vemos por um tempo o abuso de poder de Negan sobre as comunidades (Alexandria, Alto do Morro – ou Hilltop – e o Reino) e uma conversação entre essas para derrubar o imperialismo do líder dos Salvadores. Todo esse período precede uma guerra devastadora para todos os envolvidos.
Então, aceitando ou não, o foco de The Walking Dead agora é se encaminhar para um grande evento, onde as comunidades rendidas a Negan se unem para tentar derrubá-lo. Os zumbis ainda estão lá fora, a necessidade de encontrar suprimentos ainda existe, mas o enredo central da história agora é esse: guerra. É como se fosse a Guerra Mundial do apocalipse, se víssemos Alexandria, o Reino, Alto do Morro e os Salvadores cada um como um país.
Cada palavra aqui transcrita é para que por mais uma vez compreendamos que a série não está sendo produzida sem planejamento algum. O canal AMC, os produtores, redatores e toda a equipe de The Walking Dead não estão gravando cenas aleatórias e transmitindo na TV. Tudo isso faz parte de uma história previamente planejada e roteirizada. Com alguns pequenos furos de enredo? Claro. Mas, e que programa de TV não os possuí?
Não podemos achar que tudo é feito sem planejamento. Às vezes os fãs (ou os que assim se nominam) passam dos limites e argumentam como se a série fosse feita só pra preencher horário dos canais. Se fosse assim, não seria uma das séries mais assistidas do mundo conquistando milhões de espectadores em cada temporada.
Concluo. The Walking Dead não perdeu seu foco, apenas como toda a sociedade adaptou-o e transformou-o à medida que os anos passaram, tanto para seguir o material original, quanto para respeitar a essência humana. Quem ainda, na sétima temporada, perde-se em reclamar com argumentos pífios, talvez não mereça alcunha de fã da série.
The Walking Dead, a história de drama mais assistida da TV a cabo, vai ao ar nas madrugadas de domingo para segunda-feira no AMC Internacional, às 00h, e no FOX Action (canal do pacote premium FOX+) e FOX Brasil, às 00h30. Confira todas as notícias sobre a sétima temporada.
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