Nas duas primeiras partes da nossa matéria (confira aqui e aqui,respectivamente) vimos como a criação e distribuição de jogos de tabuleiro foi dominada desde o Sec. XIX pelos americanos. Nesta parte final vamos ver como as empresas alemãs assumiram a liderança do mercado mundial e ditou os novos rumos da produção de boardgames.
Os europeus, mas em especial os alemães têm uma profunda relação com os jogos de tabuleiro. Diferente da maioria dos países, na Alemanha, desde o sec. XIX desenvolve-se uma indústria voltada ao mercado interno, mas que chegou, em alguns momentos, a exportar para o resto do continente. Durante as crises econômicas dos anos 60 e 70 os boardgames popularizaram-se ainda mais e atingiram a classe trabalhadora, principalmente por ser um hobbie barato.
Vale lembrar que desde o final da segunda guerra mundial o mercado alemão, que já tinha suas especificidades, passou a ter ainda mais características exclusivas. Uma delas é a ausência de temas bélicos. Enquanto na maior parte do mundo os wargames são um estilo de jogo apreciado, na Alemanha eles são estritamente censurados pelo governo que evita a todo custo a proliferação de idéias militares e expansionistas. Para se ter uma idéia jogos como Risk (War, na edição da Grow) só começaram a ser produzidos por lá na década de 70 e com uma série de adaptações para minimizar o seu caráter bélico.
Neste momento os jogos produzidos já tinham características próprias, mas uma linha de produtos influenciou ainda mais na definição de uma identidade para os jogos alemães. Em 1962 a empresa química 3M entrou no mercado de jogos com a criação da série de jogos 3M Bookshelf. Os jogos tinham como público alvo os adultos, tinham um acabamento de luxo nas embalagens e componentes e um designer projetado para ter uma aparência de enciclopédia e poderem ser guardados numa prateleira de livros. A série inicialmente era composta de jogos clássicos com xadrez, gamão e Gô, mas, com o passar dos anos começou a lançar títulos próprios criados por alguns dos maiores designer de jogos americanos da época como: Alex Randolph e Sid Sackson. A série fez muito sucesso de público no mercado alemão.
A partir dos anos 70 os jogos de tabuleiro já eram um mercado setorizado com produtos para todos os públicos.
Outro fator decisivo para a consolidação do mercado germânico foi à criação do Spiel des Jahres (Prêmio de melhor Jogo Ano) com o objetivo de prestigiar os melhores designer de jogos e promover a melhoria da qualidade no mercado. Atualmente é o maior reconhecimento a qualidade de um jogo no mundo e tem um fator de venda importantíssimo. Para dar uma dimensão: um jogo novo vende, em média 500 a 3000 unidades, na Alemanha. Um jogo indicado ao Spiel des Jahres alcança 10 mil unidades e o vencedor do prêmio atinge 300 mil a 500 mil cópias.
Em 1995 é lançado o jogo que deu o pontapé para a entrada dos Eurogames no mercado americano: Die Siedler von Catan Colonizadores de Catan). O jogo venceu o Spiel des Jahres e se tornou sucesso de venda em toda Europa. No ano seguinte foi lançado nos Estados Unidos. Hoje já conta com mais de 18 milhões de unidades vendidas (contabilizando-se o jogo básico e as expansões) e tornou seu designer, Klaus Teuber, um milionário.
Catan teve duas influências fundamentais no mercado americano de jogos de tabuleiro: Abriu o ao estilo de jogos europeus e reascendeu o interesse do público nerd pelos jogos de tabuleiro. Após as década de 80 o mercado americano foi dominado pelos jogos de computador e videogame. O jogo de Teuber atendeu uma demanda latente pelos jogos de mesa. Após ele as empresas americanas começaram a acompanhar cuidadosamente os lançamentos europeus para lançá-los nos Estados Unidos e muitas passaram a lançar títulos próprios de autores americanos com estilo de regras europeus.
A invasão germânica ao mercado americano também levou a um sentimento de saudosismo pelo estilo de jogos produzidos pelas pequenas e médias empresas americanas nos anos 60 e 70. Novos títulos também começaram a surgir para atender esta nova demanda de mercado. Começa neste momento um dos principais rachas do mercado lúdico. Para diferenciar os novos títulos dos eurogames e criado o rótulo ameritrash.
Mas, afinal, qual a diferença entre ameritrash e eurogames?
Os eurogames tem regras simples, tempo de jogo curto ou médio (entre 30 e 60 minutos), alto nível de interação entre os jogadores. Eles dão ênfase à estratégia, tem baixa dependência de sorte e pouco conflito direto entre os jogadores. Utilizam pouco os temas militares, e normalmente não há eliminação de jogadores na mesa até o final da partida.
Os ameritrash são jogos onde o cenário e as características dos personagens do jogo são mais trabalhadas que as regras. Geralmente há conflito direto entre os jogadores e médio a alto nível de sorte envolvido no desenrolar da partida.
Na leva de títulos que surgiram dos dois estilos há cenários para todos os gostos: fantasia, históricos, grandes guerras, humor, ficção científica e terror. E, dentro deste cenários de forte disputa de mercado, um filão começou a crescer com força avassaladora: os jogos de zumbi. Conforme dissemos na segunda parte desta matéria, o primeiro título sobre zumbis surgiu em 1978 e era uma adaptação do filme Dawn of the Dead de George Romero. Após ele o tema foi esquecido só voltando a ter títulos relevantes a partir da década de 90. Nos últimos 10 anos os mortos-vivos se tornaram figuras recorrentes nos lançamentos. A cada ano dezenas de jogos sobre zumbis invadem o mercado, dos mais sérios a títulos de humor como a série Munchkin Zombies.
A Partir da próxima semana vamos explorar os principais títulos lançados no mercado americano.
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