Atenção! Este conteúdo contém SPOILERS do quarto episódio, S08E04 – “King County”, da oitava temporada de Fear the Walking Dead. Caso ainda não tenha assistido, não continue. Você foi avisado!
Nostalgia, ultimamente esse elemento tem sido muito usado nas obras audiovisuais mais recentes. A nostalgia pode propor ao público lembranças positivas sobre as obras nas quais consomem, ela traz esse senso positivo e agradável por acessar a memória afetiva dos fãs e do público em geral. Porém, esse elemento tem sido uma verdadeira válvula de escape para as produções que buscam na nostalgia apenas o afeto para com os telespectadores, e que por muitas das vezes acaba valorizando apenas a ideia de gerar essa sensação positiva, e acaba deixando de lado o aproveitamento dessa ferramenta como algo que possa favorecer a narrativa como um todo.
Recentemente tivemos diversas obras que se apoiaram da nostalgia para conseguir extrair emoções do público, mas que não conseguiram usar disso para enriquecer o roteiro como um todo. Felizmente, esse não é o caso de “King County” (Condado de King), o quarto episódio da 8ª e última temporada de Fear the Walking Dead.
Não séria um absurdo considerar esse um dos melhores episódios de todo o derivado, pois o que encontramos aqui não é um episódio de Fear the Walking Dead, mas sim um episódio de The Walking dead.
Após um terceiro episódio repleto de erros e incoerências, a série nos presenteia com um quarto episódio nostálgico, e que ao mesmo tempo caminha com a história e conclui arcos de personagens iniciados a mais de uma década.
Antes de citarmos os diversos pontos positivos desse episódio, seria um erro negar que ele possui alguns pontos negativos e algumas incoerências. Sim, o episódio não é perfeito e possui alguns erros, mas, felizmente, diferente do episódio anterior, os pontos negativos não afetam ou reduzem a obra como um todo.
Uma das coisas mais forçadas de todo o episódio é fato de os personagens saberem com muita facilidade o local aonde Morgan (Lennie James) estava se dirigindo. O episódio até tenta explicar esse fato incoerente, mas a justificativa não é muito plausível e faz parecer que os personagens apenas sabem de sua localização porque o roteiro precisa da presença deles naquele momento.
O episódio possui um texto muito bem escrito e rico em seus detalhes mais minimalistas, além de contar com uma direção muito competente. Mas, toda a cena em que Finch (Gavin Warren) ataca Shrike (Maya Eshet) com uma cadeira e consegue fugir da base de PADRE com muita facilidade parece uma cena digna de trapalhões de tão ridícula e mal conduzida que foi.
Além de ressaltar um problema que vem se agravando a cada episódio, o fato de que PADRE são os vilões mais burros de toda a franquia. É impressionante a facilidade na qual os personagens tem de fugir da base ou de enfrentar seus “soldados”. Como ocorridos no primeiro e terceiro episódio da temporada, aonde Madison (Kim Dickens) e Mo (Zoey Merchant) conseguem sair da fortaleza de PADRE com uma facilidade absurda, ou como Daniel (Rubén Blades) consegue render e emboscar os membros do grupo sem nenhuma dificuldade.
Esses problemas referentes a incapacidade do grupo e o quão fácil se torna rende-los apenas tira toda a tensão, mistério e periculosidade em volta deles e torna esses novos vilões ao invés de ameaçadores, risonhos.
Desde que foi revelado no trailer da temporada que King County seria revisitado nesses últimos capítulos do derivado, isso tem se tornado o elemento mais esperado dessa primeira leva de episódios. A curiosidade sobre o que seria abordado nesse local e o que poderia acontecer deixou toda a base de fãs inquietada, e com certeza foi o grande chamariz desse último ano da série.
Finalmente nesse quarto episódio voltamos aonde tudo começou. E, como dito anteriormente, o episódio se aproveita da nostalgia para conseguir extrair o máximo de emoções que puder do público, e com certeza ele conseguiu isso, mas a parte boa nisso tudo é que ele consegue usar desse elemento nostálgico para avançar no desenvolvimento e arco de personagens.
Revisitar essa ambientação tão icônica da primeira temporada da série principal trouxe de volta para esse universo um gostinho de como era a sensação que essa obra nos causava no início, além de nos fazer refletir sobre tudo o que aconteceu com esses personagens durante todo esse tempo. Ao revisitarmos a casa aonde Rick (Andrew Lincoln) e Morgan se escondiam dos zumbis no primeiro episódio de todo esse universo, nos faz lembrar e repensar sobre toda a jornada que esses dois personagens tiveram em torno desses anos, além de refletirmos sobre quem eles eram e quem eles se tornaram.
Quando o episódio passeia por essas ambientações, nas quais foram muito bem recriadas, diga-se de passagem, ele nos faz refletir e usar desse espelho narrativo a todo tempo. Isso vai desde a evolução dos personagens, até todo o trabalho de deterioração dos cenários. O quão morto e destruído esse mundo está e o quanto da humanidade esses personagens perderam ao longo dos anos.
Desde de que o personagem reapareceu no final da 5ª temporada de The Walking Dead, com uma filosofia puritana e uma doutrina mais humanitária, Morgan se tornou muito polêmico, e tudo isso se agravou muito mais quando ele deixou a série principal para protagonizar o único derivado até então.
A verdade é que apesar de não funcionar muito bem como um protagonista e bilhar mais como um coadjuvante, Morgan é um personagem incrível e um dos mais complexos e bem trabalhados desse universo, mesmo considerando os seus altos e baixos.
Sempre é muito mais fácil se identificar com um personagem que toma as atitudes mais coerentes com o que o momento pede, sendo elas violentas ou não, como foi com Rick durante toda a 4ª e 5ª temporada da série principal, do que com um personagem que sempre busca ser razoável e mais humano possível, que escolhe desarmar ao invés de matar. Talvez esse tenha sido a grande questão do personagem para com o público.
Talvez adotar uma filosofia mais purista e humanitária em um mundo caótico e violento seja a escolha mais difícil. O que torna Morgan interessante não é a sua força, mas sim sua fraqueza. Nesse episódio o personagem finalmente consegue fechar um ciclo que está em aberto a praticamente treze anos.
Toda a jornada do personagem nos últimos anos tem se voltado em ajudar pessoas e construir laços, mas o mais interessante nisso tudo é a hipocrisia do personagem para com sigo mesmo. Morgan sempre foi assombrado pelos traumas e fantasmas de seu passado, fantasmas esses que ele nunca conseguiu enfrentar, mas que busca ajudar o próximo a enfrentar os seus conflitos, na esperança de ajuda-lo a enfrentar os seus. Na sexta temporada, John Dorie (Garret Dillahunt) está passando por uma crise existencial depressiva, e ele tenta ajudá-lo e convencê-lo de desistir de seu suicídio, ele fala sobre futuro, esperança e a superação de passado, quando nem ele conseguiu fazer isso.
Esse episódio é fundamental e poético para o personagem pois aqui ele finalmente enfrenta e supera os traumas de seu passado e passa a viver pelo futuro. Pois até então, não importasse quantas vezes ele passasse por mudanças ou adotasse outras doutrinas de vida, uma hora ou outra ele sempre acabava cedendo para seus traumas e isso o consumia. Foram diversas as vezes em que tanto em The Walking Dead, quanto Fear, nos mostraram essa dualidade do personagem. Mas aqui, finalmente, ele consegue selar essa fase de sua vida.
No episódio, Morgan se encontra em situações aonde as suas escolhas poderão interferir no seu futuro, desta vez mais do que nunca. Ele precisa escolher se vai “finalizar” o seu passado ou permitir que ele acabe com seu futuro.
Revisitar King County trás memórias sombrias e ativa no personagem a parte mais questionável de sua sanidade. Então, ele se vê em uma situação na qual ele precisa tomar forças para seguir em frente ou deixar que seu passado literalmente mate seu futuro, como na cena em que Morgan precisa atirar em Duane para salvar Mo. Essa não é apenas uma cena em que mostra que o personagem conseguiu forças para enfrentar os seus “fantasmas”, mas também é uma cena que mostra que ele abriu mão de seu passado, no caso o seu filho, para poder se dedicar ao futuro. A cena mostra que ele finalmente conseguiu se desprender de sua antiga família para que ele possa viver a sua nova.
Além das alucinações que ele tem com sua ex-esposa Jenny (Keisha Tillis), que aparece em todas as vezes em que ele precisa tomar alguma decisão crucial. Quando finalmente consegue ignora-la, ele deixa de lado a sua esposa morta para cuidar e salvar a sua atual mulher, Grace (Karen David), que está morrendo.
Após ignorar Jenny e finalmente finalizar Duane, Morgan consegue não só abrir mão de seu passado, mas como também se entregar para o futuro. E a cena que concretiza essa passagem do personagem é quando ele enterra sua ex-esposa e filho, aonde ele cela o seu passado e coloca sobre seus túmulos uma flor branca, que simboliza o perdão e a paz. “Perdão” como ele mesmo diz perante ao túmulo deles, e a Paz que simboliza o seu estado atual por finalmente ter conseguido se desvincular de seu passado. A flor branca também pode representar a passagem do personagem para uma nova vida e uma nova jornada que virá pela frente.
Essas cenas são simbólicas e o texto é muito rico em finalmente colocar um ponto final nessa história. No final, o que é nos passado é o sentimento de conclusão, não só de um arco de personagem, mas também de um ciclo.
Além de ser um episódio rico em seu texto, King County também é um acerto técnico muito grande. O episódio é dirigido por Kenneth Requa, que até então nunca havia dirigido nenhuma produção com exceção a websérie “Dead In The Water” lançada em 2022, e mesmo com muito pouco experiência o diretor se mostrou muito competente, pois consegue extrair o melhor de seus atores e consegue transmitir com muita eficácia os sentimentos necessários para que a obra funcione.
Além de todo trabalho de trilha sonora que já é um dos melhores de todo o derivado, a trilha se torna nesse episódio parte fundamental da imersão. Obviamente os compositores não chegam aos pés do trabalho genial que Bear McCreary fez na série principal, mas nesse episódio a trilha foi um dos grandes acertos.
Assim como todo o trabalho de ambientação urbano que é o melhor da temporada. Todo o cuidado da produção em fazer com que a ambientação fosse tomada pela vegetação e pela decomposição é digna de elogios e reconhecimento.
Além da direção de fotografia que extrai lindos takes, como os da cena da casa e dos zumbis em chamas que usam da iluminação do fogo para deixar todos takes ainda mais lindos. Esse episódio brilha muito na questão técnica e muitos desses aspectos foram fundamentais para a imersão e enriquecimento dele como um todo.
Como citamos na crítica do segundo episódio, desde suas reintroduções, Dwight (Austin Amelio) e Sherry (Christine Evangelista) nunca tiveram muito destaque ou papéis de considerável relevância, mas se tem uma coisa que essa temporada está conseguindo trabalhar muito bem é a relação desse casal.
Quando Dwight e Sherry apareceram pela primeira vez no episódio ficou a impressão de que o roteiro apenas os colocou naquele lugar por se tratar de uma ambientação da série principal, ainda mais considerando que ambos também vieram dela. Mas ao decorrer da trama foi possível notar a importância desses personagens para com os acontecimentos.
Na cena em que os soldados de PADRE rendem Morgan e questionam o porque dele estar ali, Dwight se mostra o mais humano possível após Morgan revelar que suas intenções são pessoais e que envolvem o seu passado. É interessante essa ação de Dwight, pois é um reflexo do que aconteceu com ele em sua chegada na série. Morgan acolhe Dwight e nunca o julga por ter feito parte dos Salvadores, ele o recebe e também recupera sua humanidade e esperança, algo que ele já parecia não ter. E, ao agir assim, ele retribui as ações que um dia aquele homem teve com ele.
É interessante ver a evolução do personagem, que busca por sua redenção desde que saiu de The Walking Dead. E toda a relação familiar que ele vem construindo com sua esposa e filho, assim como suas ações mais humanas e honestas, como o acolhimento que ele teve para com June (Jenna Elfman) no segundo episódio, tem se mostrado a concretização de sua redenção.
A cada episódio em que é explorado essa relação familiar entre Dwight, Finch e Sherry, a série tem conseguido criar uma empatia e conquista para com o público. Fazendo com que se espere que esses personagens tenham um desfecho feliz e digno. E ao que tudo indica, essa relação será fundamental para a conclusão desse arco envolvendo PADRE, que parece que será finalizado ainda nessa primeira parte da temporada.
King County é um excelente episódio, que possui um texto simbólico e rico em analogias. Serve em ser o fechamento de um arco incrível de personagem. Ele cumpre muito bem naquilo que se propõe a ser e é um dos melhores episódios de todo Fear the Walking Dead. Além de contar com uma atuação impecável de Lennie James, que tem facilmente a sua melhor performance dentro do personagem.
Uma questão que teria sido mais assertiva e condizente com o que foi visto aqui, seria se esse episódio tivesse ficado mais para o final da temporada, ou se esse fosse o derradeiro episódio do Morgan dentro da série, pois aqui o seu arco está mais do que fechado e isso foi feito de uma forma muito satisfatória.
O que nos resta é esperar e torcer para que a série não estrague toda a construção de personagem que foi feita nesse episódio, algo que Fear faz com frequência, mas que por ser a última temporada e estarmos entrando na reta final da série, cremos que isso não acontecerá.
Assim como esperamos que a trama envolta de Grace (Karen David) não se repita novamente ou que tenha uma conclusão um tanto quanto covarde. Já que no episódio a personagem revela que está doente novamente (aparentemente vítima de um câncer, como visto nas temporadas passadas). Desde sua introdução a personagem passa por momentos precários devido aos seus problemas de saúde, como visto na 5ª e 6ª temporada na qual ela está refém de um câncer causado pela sua exposição a radiação na usina em que trabalhava.
Ela conta a Morgan que está doente de novo, e quando isso é revelado a sensação que nos dá é a de uma repetição de tramas. Porém, no final do episódio, Grace é mordida num local letal e sua situação se torna ainda mais agravante. Se essa questão que envolve a saúde de Grace é um ponto que será bem trabalhado ou se será mais um ponto negativo e repetitivo, está nas mãos dos próximos episódios, aonde teremos o desenrolar e a conclusão dessa trama.
Até o momento, toda essa história parece uma repetição de algo que já foi explorado mais de uma vez na série, e que havia sido bem concluída no 12º episódio da 6ª temporada “In Dreams”, que possui um final chocante e imprevisível, e que até então havia encerrado essa questão como um todo. Aparentemente, Grace terá de enfrentar dois grandes desafios pela frente, impedir que a infecção zumbi se propague antes que seja tarde e enfrentar mais uma vez um câncer que domina o seu corpo.
Por fim, o episódio tirou o gosto amargo que o seu desastroso antecessor deixou. E deixa a esperança de termos mais episódios tão bons quanto esse no restante da temporada. Fear recupera novamente o fôlego com esse belíssimo e poético episódio, e finaliza um arco de personagem estendido a mais de uma década.
Fear the Walking Dead – S08E04: King County
Nota: 8.7/10
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