Entrevista
ABRA-CADÁVER – Uma super entrevista com Greg Nicotero
Originalmente um discípulo do grande Tom Savini (da série de filmes de mortos-vivos de George A. Romero), o mago dos efeitos especiais e da maquiagem, Greg Nicotero, tornou-se um dos faróis na indústria dos efeitos especiais. Através de seu trabalho, bem como o de sua companhia, a KNB Efx Group, o talento extraordinário de Nicotero já foi agraciado com vários prêmios e deu-lhe a oportunidade de trabalhar com alguns dos maiores nomes do showbusiness, incluindo Quentin Tarantino, no inédito Django Livre. Mas, por enquanto, sua prioridade é nos apavorar em The Walking Dead, da AMC. Com a terceira temporada em andamento, a The Walking Dead Magazine encontrou-se com Nicotero para descobrir que horrores sinistros ainda esperam por nós.
Texto e entrevista : Tara Bennett, The Walking Dead Magazine #2
Se Robert Kirkman é o herdeiro extra-oficial para o trono zumbi do novo milênio, então Greg Nicotero é seu braço direito e o comandante de todas as coisas sangrentas e horrendas.
Um veterano com vinte anos de efeitos especiais para cinema e TV, Nicotero é co-fundador da Oscarizada companhia KNB Efx Group (formada pelos empresários de efeitos especiais dos anos 80 Robert Kurtzman e Howard Berger) e, através dela, criou efeitos de maquiagem para mais de 100 projetos incrivelmente diferentes, de Crônicas de Nárnia a Grindhouse. Porém, é seu trabalho como co-produtor executivo, supervisor de efeitos especiais e diretor em The Walking Dead que deu ao maestro das mortes originais e gags visuais o ambiente necessário para ampliar os seus limites criativos.
Uma das coisas que mais o entusiasma em relação ao show é a liberdade para criar uma loucura zumbi, que tem uma peculiar distorção de originalidade em relação a ela, o que ele costuma chamar de “gags”.
“Independente do aspecto dos efeitos, eu somente projeto coisas que nunca vi antes”, Nicotero conta a TWDM durante nosso bate-papo exclusivo nos últimos dias de produção da terceira temporada. “Muitas vezes, um escritor irá telefonar e dizer ‘Hey, nós temos algo aqui. Que tal se fizéssemos assim?’ Nós sempre iremos esconder algum detalhe para a hora da filmagem, então sempre parecerá algo novo, e eu acho que esta é a razão pela qual os zumbis tem tanta repercussão junto ao público. Eu tenho muito controle criativo sobre o que são esses “gags” e isso dá bastante liberdade. Você aspira por liberdade durante toda a sua carreira para poder fazer o que você quiser visualmente. “
Nicotero diz que ele está entusiasmado por ter testemunhado em primeira mão como o público respondeu ao seu trabalho este ano. “Steven Yeun (Glenn) e eu assistimos a première em um bar em Atlanta, e ficamos lá, bem nos fundos. Ele dizia ‘Eu vi aquilo. Eu não sei se quero ver de novo.’ E eu disse ‘Vamos lá, cara, vamos olhar para a reação das pessoas!’ Sentamos lá, sabendo exatamente o que iria acontecer, mas quando Hershel foi mordido e eles o arrastaram para a sala, e Rick tira sua cinta e pega o machado, as pessoas estavam gritando. Steven e eu estávamos lá nos fundos dando risada. Foi incrível como eles estavam envolvidos naquilo.”
REDEFININDO O GÊNERO
Um colaborador de criação integral no seriado The Walking Dead desde o episódio piloto, Nicotero diz que ele gosta de como, em apenas três temporadas, eles estão redefinindo o horror/drama convencional na televisão.
“É difícil para mim ler vários artigos e revisões (sobre a série), porque as pessoas irão simplesmente dizer que é um “programa de zumbis”. Verdadeiramente, porque nosso show é tão peculiar, as pessoas não podem rotulá-lo. Mesmo quando eles desesperadamente querem chama-lo de ‘apenas mais um programa de zumbis’. Não é só isso, há muito drama de qualidade nele. E eles não podem simplesmente dizer que é um drama, porque há vários elementos de gênero.”
“Nós fomos bem sucedidos em mostrar esses gêneros de drama e horror de uma maneira que as pessoas não consigam definir o show. Eu acho que isso é ótimo, porque significa que as pessoas irão se ligar, e se você pegar uma amostra de cinco pessoas diferentes, cada uma delas terá algo diferente a dizer a respeito.”
Nicotero está no show desde o início, e desde então ele é uma parte integrante deste sucesso. Tanto é assim que ele já sentou-se na cadeira do diretor algumas vezes. Ele comenta: “Em um cronograma de oito dias, você não tem muito tempo para fazer o trabalho de qualidade que o show exige. Como eu construí tudo, apenas fez sentido que eu pudesse detonar tudo no final do dia e eu deveria filmar esses pontos de ênfase. Eu daria a eles o tempo necessário e eu saberia como filmá-los. Isso nos deu um monte de espaço.”
TOMANDO RUMO
“A ironia está em, evidentemente, em que, no primeiro episódio que dirigi (Judge, Jury, Executioner), havia somente um zumbi,” diz Nicotero, rindo. “Foi engraçado porque eu estava esperando zumbis e um milhão de ‘gags’, mas o que eu ganhei em troca foram ’12 homens furiosos’”
Desta experiência, Nicotero rememora: “Eu estava realmente entusiasmado, porque eu sei como filmar o que está no núcleo, eu sei como filmar os zumbis, e além do mais, tive a oportunidade de filmar aquela cena (na casa de Hershel) com todo o elenco do show, e matar um personagem amado (Dale); e eu sou amigo de Jeff DeMunn há doze anos! Na verdade, Jeffrey e eu tivemos um jantar assim que chegou o script, e eu lhe passei um rascunho, então ele sabia o que estava para acontecer. Ele literalmente disse: “eu estou tão grato por ser você, pois sei que você dará o impacto emocional que isso precisa”.
Ele adiciona: “Também liguei para Andrew Lincoln (Rick Grimes) dois dias antes de começarmos a filmar e falei a ele que estava borrado de medo. Eu senti tamanha responsabilidade pelo show, e eu queria que fosse excelente. Eu estava entusiasmado por sentar atrás das câmeras, olhar para este elenco e ser capaz de vê-los serem tão convincentes. Foi revigorante.”
TRABALHO NA NET
Fora dos seus deveres diários, Nicotero também dirigiu as duas web séries oficiais, The Walking Dead: Torn Apart e The Walking Dead: Cold Storage, que ajudaram a atravessar o longo hiato entre as temporadas, no site da AMC. Trabalhar mais e mais por detrás das câmeras fez com que Nicotero se tornasse mais focado e eficiente quando se trata de executar as sequências já bastante ambiciosas envolvendo zumbis.
“À medida em que o show fica maior, eu tenho filmado provavelmente dois dias por episódio em uma segunda unidade”, ele explica. “Nós filmamos o show em oito dias, então eles juntam os pedaços e sabemos que há partes que nos pertencem. Houve momentos em que eles diriam para filmar uma sequência inteira. Nós sempre nos concentramos em toda a ciência da coisa, então eu sinto como se me fosse dada a liberdade criativa para colocar os zumbis onde eu quiser. Eu olharei uma sequência e direi: precisamos de algum sal e pimenta aqui.’ Eu irei até o pátio da prisão e filmarei uns poucos zumbis, e falarei ao editor para colocar essa parte aqui e esta outra parte ali. Então eu assisto os episódios e ali eles estão.”
Ele também usa esta eficiência para ajudar a orientar novos diretores que trabalham no show. “Normalmente, quando os diretores chegam, eu sou uma das primeiras pessoas que eles conhecem. Muitos irão me perguntar como fazer tudo aquilo com os zumbis. No primeiro encontro, eu jogo algumas ideias a eles, como “Eu vou jogar uma cabeça de zumbi na porta de um carro e Daryl irá fazer isso ou…” Eles perguntam: ‘Poderemos fazer tudo isso em oito dias?’, e sim, poderemos. Eles acabam tendo um curso rápido de como filmar efeitos de maquiagens e cenas com zumbis em oito dias, o que normalmente levaria várias semanas para se conseguir.’
VÁ PARA O INFERNO, MARAVILHA SANGRENTA
Quando se trata de criar os momentos zumbis que tanto deliciam quanto apavoram o público em cada episódio, Nicotero diz: “É engraçado para mim, eu sequer acho que o show seja sangrento. Para mim, é intrínseco. O maior desafio é quando temos cenas maiores, com muitos zumbis, e nós às vezes perdemos nosso momento ‘um-a-um’ , que mobiliza a audiência cada vez mais. As pessoas perguntam: ‘onde estão os zumbis icônicos?” Eles não são escritos. É como eles interagem e o que eles fazem. “
“Uma das primeiras coisas que aprendi trabalhando com efeitos especiais – e isso reporta-se ao tempo em que trabalhava com John Carpenter, George Romero, John Landis e Tobe Hooper – lá no final dos anos 70 e início dos anos 80 -, quando as maquiagens de efeitos especiais eram as primeiras a aparecer, muitos filmes foram feitos simplesmente para exibir os efeitos. Houve um enorme retrocesso, porque os efeitos não serviam à história. Eram somente efeitos por si mesmos. O que eu aprendi entre Romero e Carpenter foi para nunca parar um filme para ter um grande efeito e depois reiniciar o filme novamente. Tudo deve ser intrínseco e deve ser sentido como parte do show. Eu faço um grande esforço para que cada efeito que façamos tenha um objetivo e não pareça distrair você (do show). Quando o rosto de um zumbi é explorado, simplesmente acontece e é isso, mas é algo autêntico.”
Perguntado sobre seus gags favoritos na terceira temporada, Greg pensa por um momento e diz: “Soará estranho para mim falar que alguns dos meus gags favoritos estão nos meus episódios, mas é porque eu tinha meus olhos neles, então tive certeza de que eles estariam bem caracterizados e bem filmados. Algumas vezes alguns diretores chegam e naturalmente querem concentrar-se em filmar os atores nas cenas com zumbis. Eu vou além e sugiro: ‘Filme alguns closes dos zumbis, porque as pessoas fogem de querer ver suas faces decompostas e mãos apodrecidas.’ Quando meus episódios vão ao ar, todas as coisas estão lá, porque gosto muito de filmá-las. Então, no episódio cinco (Say the Word), há uma grupo de zumbis realmente ótimos e alguns momentos em que você simplesmente diz: “pqp!”
DJANGO ATÉ O FIM
Refletindo a respeito de seus três anos trabalhando diariamente na produção de The Walking Dead em Atlanta, Nicotero é modesto quando ele fala que “o show abriu todo um novo mundo para mim e que eu não sabia que existia, depois de tanto tempo. Fez de mim um melhor profissional de efeitos especiais. Quando terminamos a segunda temporada ano passado, voei para LA por três semanas para filmar “Django Livre”, eu o abordei a partir da perspectiva de que eu precisava dar ao diretor a liberdade para fazê-lo crescer. Então tudo o que construímos para Quentin Tarantino foi feito a partir da perspectiva do diretor e uma perspectiva de efeitos. Ele estaria perguntando: ‘Espere, eu posso fazer isso aqui e também aquilo?’
Com o sucesso de The Walking Dead, Nicotero está expandindo o seu playground de zumbis para fora do set em direção ao público, com seu trabalho conceitual e de maquiagem em The Walking Dead Escape e o Halloween Horror Nights, da Universal Studios. “Para mim, é dar a oportunidade aos garotos para estarem no show. Falamos de crianças que vão até Washington DC para ficar ao pé dos degraus usados em O Exorcista. Ou eles irão até Martha’s Vineyard, onde foi filmado Tubarão, nadar na mesma praia. Os fãs do gênero são como nenhum outro, porque eles procuram ativamente qualquer contato físico com o projeto ou o show que amam.”
“Com o Halloween Horror Nights, da Universal Studios, eu estava entusiasmado com o fato de as pessoas estarem tendo a oportunidade de entrar nos cenários do show, como se estivessem lá. Eu fiz os trajetos tanto em Hollywood como na Flórida, e a primeira estação é o hospital da primeira temporada, com sangue nas paredes e as portas trancadas por dentro. Eu me lembrei daquele dia de filmagem e de montar aquelas paredes, então foi interessante caminhar ao longo delas, sob um ponto de vista nostálgico. Ter pessoas entrando no hospital, na fazenda de Hershel e no celeiro, nas ruas de Atlanta, isso dá a oportunidade que elas tanto queriam, fazendo-a concreta e tangível.”
Com o hiato logo à sua frente, Nicotero revela que ele passará os próximos poucos meses trabalhando nos efeitos especiais de Sin City 2, ao lado de Robert Rodriguez. “Então, se eu oficialmente receber o sinal verde, estaremos de volta com mais The Walking Dead”.
Claramente satisfeito por ver que a quarta temporada já aponta no horizonte, Nicotero adiciona: “Este tem sido uma das minhas experiências de trabalho mais intensas de minha carreira. Semana após semana, estamos tentando nos superar e aumentar o nível de drama, intriga e suspense. Nós amamos o show e eu nunca conheci um grupo tão dedicado de atores e equipe. Nós continuamos até que conseguimos acertar e nos alegramos em nossos sucessos, e não nos lamentamos quando falhamos, o que, felizmente, não tem acontecido muito. “
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Fonte: The Walking Dead Magazine #2
Tradução: @BinaPic / Staff Walking Dead Brasil