Ricardo Prado, do Cinecartografo nos mostra uma crítica a respeito do tão aclamado e conhecido filme de George A. Romero, Night of the Living Dead (A Noite dos Mortos-Vivos). Confiram!
Este filme foi responsável por criar o modelo de zumbi seguido até hoje nas mais diversas plataformas, desde o próprio cinema até vídeo-games (como a série de sucesso “Resident Evil”). O modelo é inspirado em antigos rituais vodus feitos pelos negros que viviam no Caribe há muitos anos. Mas as pessoas gemendo e mancando em busca dos cérebros de suas presas surgiram deste filme: “A Noite dos Mortos-Vivos” (1968), dirigido por George A. Romero e escrito por ele e John A. Russo. É também o primeiro filme de uma série sobre um apocalipse causado por uma infecção em massa que continua até hoje (o último filme, “Diário dos Mortos”, saiu em 2007).
“A Noite dos Mortos-Vivos” foi uma revolução por vários motivos. Rodado de forma independente pelos seus criadores, com um orçamento estimado em US$ 114.000, atingiu um nível de realismo que chocou o público. A inspiração de Romero veio do livro “Eu Sou a Lenda”, de Richard Matheson, que também já teve seu número de adaptações para o cinema, sendo a última estrelada por Will Smith em 2007. Mas, para “A Noite dos Mortos-Vivos”, foi apenas inspiração. Os vampiros-zumbis de “Eu Sou a Lenda” aqui são só zumbis, e olha que essa palavra nem é usada no filme. Os infectados são chamados de “ghouls”. Diz a lenda que os “ghouls” são demônios do deserto que modificam sua forma física e invadem cemitérios para comerem os mortos. Em “A Noite dos Mortos Vivos”, os zumbis (ou “ghouls”) são do jeito que eu e você nos acostumamos a ver na mídia, já que estabeleceu esse padrão, numa época em que o gênero “filme de zumbi” nem existia.
A história é bem simples, linear e não por isso trágica. Tudo começa com os irmãos Johnny e Barbra visitando o túmulo de seu pai. A forma com que o primeiro morto-vivo que os ataca aparece é realmente uma sacada muito interessante: Barbra diz que está com medo de ficar no cemitério, e o irmão, tirando sarro, diz para ela que “eles vão pegá-la” e aponta para um homem que se aproxima lentamente deles com um andar estranho. Eventualmente eles percebem que esse homem, sim, está indo “pegá-los”. Numa luta desigual (zumbis são descritos como criaturas de super-força, e desde “A Noite dos Mortos-Vivos” é assim), Johnny leva a pior e Barbra foge desesperada. Ela chega a uma casa aparentemente abandonada, e se protege lá dentro. Enquanto isso, o número de infectados do lado de fora vai aumentando.
Não dava pra fugir de certos clichês, como por exemplo Barbra ser a personagem feminina que só grita e desmaia. Depois que ela chega à casa, a história introduz o personagem Ben, que se torna o protagonista a partir daquele ponto. É ele quem faz tudo, enquanto Barbra fica em estado de choque. Algumas lideranças feministas criticam o filme por conta disso. Acham o papel de Barbra uma caricatura infeliz da mulher.
Os efeitos especiais são bem artesanais. O sangue é calda de chocolate Bosco (o que deve ter tornado mais prazeroso para os intérpretes dos mortos-vivos comer a carne e os cérebros de suas vítimas). O próprio modelo de ficar num só lugar enquanto o desastre vem até você é uma manobra para se conter os gastos. Quase não há externas (com exceção da cena inicial no cemitério, com Johnny e algumas tomadas do lado de fora da casa, para mostrar os invasores). A trilha sonora é “stock music”, ou seja, aquela música genérica que fica disponível aos estúdios para ser usada gratuitamente. No elenco, não há ninguém conhecido. Filmado em 35 mm, em preto-e-branco, “A Noite dos Mortos-Vivos” foi gravado entre junho e dezembro de 1967.
Depois do lançamento, Romero e Russo divergiram sobre o rumo da série. Tanto que cada um criou uma série próprio a partir de “A Noite dos Mortos-Vivos”. Romero continuou usando a palavra “Dead” nos títulos, lançando “Dawn of the Dead” em 1978 (“Madrugada dos Mortos”), “Day of the Dead” em 1985 (“Dia dos Mortos”), “Land of the Dead” em 2005 (“Terra dos Mortos”) e, por fim, “Diary of the Dead” em 2007 (“Diário dos Mortos”). Já Russo passou a usar a expressão “Living Dead” para marar sua série. Foram três no cinema (“A Volta dos Mortos-Vivos 1″, “2″ e “3″, lançados em 1985, 1988 e 1993, respectivamente) e uma para televisão, “Return of the Living Dead: Rave from the Grave”, de 2005, inédito no Brasil. A principal diferença entre as duas séries é que a de Russo classifica-se mais como uma sátira, diferente do tom desesperador dos filmes de Romero.
A importância de “A Noite dos Mortos-Vivos” não está necessariamente em ter criado o gênero “filme de zumbi”, mas sim em mostrar como é possível fazer muito com muito pouco. Alguns críticos da época disseram que a atmosfera do filme lembra a de um documentário, ou “newsreel” (noticiários que eram exibidos nos cinemas, na época em que televisão não existia), tamanha a sobriedade de sua direção de arte. Mais do que isso, “A Noite dos Mortos-Vivos” documenta como mentes inquietas podem fazer grandes coisas.
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